sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Uma outra história.

Que bom seria se eu tivesse vários corpos à disposição para poder zanzar por aí cada dia por um canto diferente. Como se eles fossem fantasias enfeitiçadas.
Cada corpo teria amigos distintos, personalidade definida e atrativa, um grande sonho e uma maneira peculiar de  confessar os sentimentos.
Pra cada coração, vários amores de todas as espécies. 
Apesar de compartilharem da mesma mãe, esses meus corpos não seriam irmãos. Estariam sob o domínio da minha mente e, todas as noites, sonhariam os mesmos sonhos, porém, os sonhos serão extensos pra caber as imagens dos desejos de cada um. Pois seria nos sonhos que eu, a mente controladora, me sentiria completa. Daí minha ambição estaria satisfeita: não falta ser ninguém.
Poder ser todos. Poder ser! Em um corpo um vagabundo, no outro uma amante exímia conhecedora dos jogos do amor, o outro é um intelectual sem partido que contribui para a democracia, o outro é viajante, e tem também o velho que nunca morre. Esses são só exemplares da vasta coleção de pessoas que eu seria. Tudo pra não ser eu.
Pra não me sentir tão boba por não conseguir "ir à igreja e ao carnaval com a mesma devoção". Pra não estar sentindo tão decepcionada comigo mesma. Pra não sentir o fracasso de não ser sempre radiante, sempre bela e leve.
E, depois de experimentar as várias vidas que teria, talvez eu quisesse guardá-las todas em um baú ou em um sarcófago, pra mostrar respeito. É claro que não os enterraria... por desconhecer minhas futuras manias e planos de fuga (apenas por isso). 
Então quem sabe eu viria com alguma resposta. Uma bússola seria o ideal. Ou um cristal-guia embutido no peito. É que eu necessito descobrir como é que a gente faz pra ser querido, amado, indispensável até. Como cativar corações impossíveis, como ajudar um triste a ser feliz. Por esse último segredo eu cumpriria uma promessa, ou duas. Ficaria a critério do guardião dos segredos da existência humana.
Agora eu me sinto sem pernas nem dentes nem unhas. Imóvel e impossibilitada. Um parasita, sim. Dos corpos que eu escolho, na vida real, pra sugar um pouco de força, de piedade.
Por enquanto eu só quero deixar o nó na garganta ficar bem apertado. Perder a consciência. Desligar por um tempo. É. Eu quero desligar.



Um comentário:

  1. Olá!!

    O bom de escrever é que vc pode sim, ser isso tudo! Boa sorte nas viagens!


    Obrigado pela visita, volte logo.

    Bjs!

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