quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Dele

Sou pista de pouso, galho de árvore anciã, ombro descoberto de menina arteira, o batente da janela, a fruta madura, a mata ciliar ao redor do rio, cada palmo de chão gramado do mundo; onde você pousa, deita, vem e fica. Depois vai embora.
E o outro dia de manhã é lindo. Desse alimento que me dá quero ter sempre. E este 'sempre' não é assim tão mentiroso uma vez que é quase certo que você volte; quando estiver ao alcance de uma pequena viagem, uma chamada telefônica.
Abastecida e rica estou agora e meu único pedido só poderia ser: que dure pelo menos até eu chegar lá.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Espero mudar de assunto no próximo...


Em um minuto abraçada com você eu posso tudo.
Só preciso de um minuto pra perceber que era de você que meus sonhos falavam noite após noite, sem dar descanso. Era um mistério sem fim, uma novela que nunca se desenrolava. Mas agora... agora eu tenho certeza porque, por um minuto, fui o corpo quente e emocionado que envolvia; fui seu amparo; sua companhia. Por meus mais ricos sessenta segundos, fui o centro das atenções dos seus ossos, seus músculos, sua mão machucada.
Imersa nas lavas que passeiam por minhas veias por te ter tão perto, sou capaz de prometer os absurdos: perdoar seus piores erros (os passados e os que virão) e nunca te lembrar deles e nunca usá-los para convencê-lo do que quer que seja. Ser sua somente; e de ninguém mais; nem no pensamento, nem na loucura, nem na embriaguez, nem no devaneio, nem na fantasia, nem na lembrança; tudo meu carregará seu nome e cheiro; tudo meu lhe pertenceria. Renunciar minha vontade quando o motivo for você; mudar de direção, de cidade, de planeta só pra te acompanhar. Comer só do que você achar que devo, quando devo, o que devo: se sua carne ou uma fruta; sou sua. Fugir deixando as roupas do corpo pra trás; encarar a estrada, a rua, o mundo. Cortar meus cabelos; deixá-los crescer até os pés: sou sua. Acordar antes do sol pra por a sua mesa; tirar a mesa depois de vermos a lua. Te acordar com um beijo ou mil; nenhum eu não aceito; são seus. Beber água ou vinho, sangrar sangue ou vinho, rasgar pele ou pão: sou sua. Tatuar o corpo, trocar a pele, misturar com a sua: sou sua. Dormir no escuro; com a lâmpada acesa; debaixo do sol; em cima do espinho. Ir embora à pé; de trem; de joelhos; de carona: sua. Ficar muda; ler mil páginas de um romance; inventar mil páginas de um romance. Velar tua insônia, viajar em seu sonho, esquecer o sono.
Fica. Eu fico quieta, não pergunto nada mas, fica. Se demore. Se deixa aqui um pouco. Deixa um pouco de você no meu ombro e colo. Não me responda, não me olhe, não explique. Mas me atenda quando eu ligar, diz que está ouvindo e que não vai desligar. Deixa eu contar minha história, do quanto de mim consegui construir sem você. O quanto de mim não é mais. 
Ah, se você soubesse falar sim! Se não impusesse tantas restrições! Se não nos proibisse. Então aceitaria o que não cessei de oferecer. Mas antes, uma promessa: não fique nem um segundo a mais depois que descobrir que não sou eu quem você mais deseja. Não precisa amar, se entregar, se render. Apenas me queira, como se não existisse nenhuma outra de mim. Porque estou convencida de que não existe nenhum outro de você; nem de parte de você; nem de relance.
Em um minuto seguido de um sim, eu mudaria minha feição: um sorriso leve me acompanharia até o meu fim. Uma batida bem “samba” tocaria dentro. Eu veria o sol todas as vezes que o céu nublasse. Rouxinóis cantariam em meus ouvidos em plena floresta de pedra. O vento faria cócegas no meio de um furacão, ou num vale fundo. A folha teria gosto de morango, e o café ralo, de chocolate. O chão seria macio, o cair, gracioso.
Se algo do que eu dissesse te mudasse de ideia... precisariam inventar uma nova língua porque eu esgotaria todos os dicionários.

Ai, se você ficasse, querendo.

Ai

terça-feira, 23 de agosto de 2011

O contrário de tudo que já quis e fui.

A música no fone de ouvido antes de dormir não é para dar prazer aos sentidos: cala o pensamento. Este que anda tão inquieto à procura de respostas que nunca vai achar porque estão na posse de um outro que não eu. Então invento. Digo que escrevi a música e a próxima da playlist é sua, dedicada a mim. Não importa o que os cantores digam. Se são palavras duras e revoltadas ou doces e meigas. Porque eu só preciso que digam algo e não me deixem nesse silêncio assustador. 
Olha, sou só eu ocupando esse espaço tão grande.... por que não dois? Por que não nós? É só minha voz que conversa comigo; por que não a sua?
Está cada vez mais difícil dizer algo "do fundo do coração". Ele é buraco negro sem fundo sem chão sem pelúcia vermelha sem.
É isso mesmo: tem sido um cotidiano de subtrações. E isso não é eufemismo para furtos. Nada me foi roubado, como os mais acostumados com meu drama e extremismos poderiam supor. Aquele dito sobre o que é seu volta, me convence. Só não me alegra. E por um detalhe: nada tenho.
A não ser um corpo abandonado, ideias que não lhe interessariam, e um futuro flexível... até demais. Isso de poder ser tudo e nada às vezes me paralisa. Mas a gente segue, querendo ou não, sabendo ou não porque é assim que é.
Minto: não fui de todo subtraída. Ganhei uns quilos, umas dores de cabeça, uns sonhos estranhos. Nada que me atrapalhe, juro. Minha única preocupação é quanto a essa vontade louca de ir pro último dia do ano e nunca ter sabido seu nome. Muito menos seu endereço. Menos ainda você narrando suas histórias; menos chuvas, menos mãos, menos sol, menos comida, menos madrugada, menos filmes, menos sala, menos. Menos.
Estranho isso de querer reduzir, quem antes só queria saber de chegar.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Sobre jardins e pessoas

Quero sorrir e quero chorar. Quero ser todas elas: as loiras, as ruivas, as orientais (se é que encontrou uma). Quero ser a única jambo.
Calma, não balance a cabeça. Contento-me em estar no centro de um pequeno bosque a nordeste do ponto de referência mais importante que tiver, seja ele qual for. 
Eu sei que existem outros esconderijos, cavernas e estátuas. Porque eu sei que você não é um jardim; é floresta. 
Que eu quero conhecer com cada linha de minha digital; 
toda vez que trocar de pele, quero apresentar minha superfície à você; 
quando uma nova gota de saliva ou suor brotar de mim quero oferecer para deguste de sua língua; 
antes de os odores se desprenderem e ganharem o ar, quero que os inale e entorpeça; 
cravar minhas unhas em você antes que eu as corte e elas cresçam sem te conhecer.


Se não posso ser todas (elas) ainda há a chance se ser toda (eu). E uma pessoa inteira vale muito; vale mais que várias pessoas-pela-metade (ou nem isso) juntas. Você vale mais e, se meus olhos brilham, é de ver tanta riqueza junta.
Não vou mentir dizendo que não sinto medo quando chega a noite e ouço barulhos estranhos, risos escancarados, asas batendo das folhas _ festa na floresta. Medo de definhar esquecida em um lugar sem água nem alimento. De sofrer e você não se importar. 
Mas a bem da verdade é que não se importa. E eu sei. E fico. Elas sabem e ficam. Andamos nuas a te servir, alegremente; uvas na boca, água quente nos pés. E fico não sei porque. Por não ter pra onde ir? Por gostar de algo  misterioso que só tem ali? Fico.
Se eu beber você fico jovem pra sempre; e eu bebo _ se se colocar a um gole de distância de mim. Não me censuro, nem você. 
Espero no tal bosque escondido, a nordeste, etc. É só seguir o barulho das águas inquietas, borbulhantes: meu sangue quando te ouço aproximar.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Pode acabar agora.

Cansada de 'acordar' significar sair do seu abraço sonhado pra sua indiferença real.
Das olheiras, da mente conturbada por tramar jeitos de consertar tudo, de reestabelecer uma leveza que se perdeu. Do desespero de pensar estar de frente pra você de novo e saber que não direi nada que não piore tudo, então calo.
O pior de tudo é saber que há a possibilidade de estar sendo enganada por mim mesma. Manipulando cada fato pra enfeitar minha existência rasa. Multiplicando, enobrecendo (se é que essa última ambição é possível).
Podia deixar pra lá, mas não. E eu nunca me vi insistindo em algo sem meu próprio consentimento. Só se meus desejos inconscientes ganharam vida própria e eu não sou mais dona de mim.
Seria bom se as palavras fizessem sentido agora. Organizassem lógica e espontaneamente e me mostrassem o que é que há.
Que me explicasse o que é que houve. Por que paramos. E a campainha não faz barulho em mim, nunca é você.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Abandono desordenado

Detesto quando acontece disso de um dia terrível não acabar. Uma noite se emenda na outra manhã e a angústia persiste.
Motivo? No sonho tudo se acerta, se conserta, se entende e aceita.
Não tem funcionado mais. Logo o sono, que sempre foi o jeito natural de apagar tudo. Os dias não eram pra ser recomeços? Penso em Sol e logo me vem a ideia de vultos do passado sumindo, vozes medonhas se calando, os bichos-papão fugindo. Mas o Sol me acordou com raios maldosos, queimando tanto quanto o frio extremo de se perceber só.


Um filme de memórias começou a desfilar diante de mim minuto após minuto e não há como pará-lo. E sou obrigada a assistir os sussurros, risadas e mãos se esbarrando. Os corpos quentes que um dia estavam vivos, as confidências codificadas em frases desconexas e quase sem sentido não fosse a pouca distância que fazia de tudo aceitável. Nada era feio demais de se dizer porque estávamos perto, em nossa companhia, em segurança.


De tanto ler romance chego ao cúmulo de pensar que a  indiferença seja uma ação movida por um sentimento nobre, uma causa notável. Poderia acreditar nisso e sossegar mas a ideia de que pode ser o contrário não me deixa.


Temo que entregar meu coração às traças novamente seja o ato mais cruel que poderia fazer contra um sentimento puro. Mas ainda é uma possibilidade.

domingo, 10 de abril de 2011

Post scriptum

Faltou eu analisar melhor minhas frases, calcular os gestos com mais exatidão, planejar os passos seguintes com mais inteligência.
Sobrou eu imaginar que morava em seu ser o mesmo inquilino meu: um sábio senhor de todos os bons sentimentos; que toca flauta pra gente dormir e diz frases profundas pra gente refletir. Sobrou olhar, pele, menos tempo.
Pra no 'fim', sobrar a falta.
Uso aspas porque o que houve não foi um fim, foi um silêncio. Não sei se um silêncio de dor, de medo, de orgulho, de preguiça...
Meu consolo é não ser proibida de escolher um desses silêncios pra ser a resposta que preciso; embora saiba que satisfazer minhas necessidades não me acalenta.
Me acalmaria ouvir que você chegou pra contar qualquer novidade, pra assistir qualquer coisa, qualquer dia desses. Ao mesmo tempo, chego à beira do desassossego quando penso que posso passar o mês inteiro esperando ouvir que você chegou. E de mês em mês lá se vai uma vida inteira...
E se chegasse, o sábio que hoje dorme, acordaria com seus conselhos e dengos.
Quem sabe eu não iria acertar?


Quer minha franqueza? Sinto como se houvesse morte. Não me julgue exagerada. Algo realmente  voltou ao pó e perdeu o fôlego. Sufocado até o último suspiro: assassinato. E não é linguagem abstrata.
Quem eu era quando tinha você por perto, morreu. Quem você se deixava ser quando estava comigo, não existe mais.
Funeral para dois.
Olho longamente pra esses corpos jovens e sem vida. Têm os rostos tão corados que tenho a impressão de que apenas dormem.
Se esse sono vai acabar ou não...




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segunda-feira, 4 de abril de 2011

Água

Livros meus aparecem úmidos. Minha mesa, meu travesseiro, minha roupa.
Encontro gotas transparentes em toda a parte. No chão do corredor, da cozinha, no pano de prato.
Se estou no meio de uma conversa qualquer, desvio a atenção por um segundo e ... mais gotas.
Olho pra partitura e ela está embaçada: é o véu molhado que me venda.
E eu espalho todo esse rio de lágrimas pela cidade. Nas praças, na padaria, na biblioteca. Lá estão elas comigo. E o pior é que me pegam de surpresa; posso estar sorrindo e distraída, estarão lá a qualquer momento.


É assim desde que foi embora sem avisar quem me ensinou a ser firme e mandar nas minhas nascentes. Ser dona delas e não um meio de desaguá-las.
Nem me incomoda tanto assim a falta de aviso mas sim a falta de laço. Um fiozinho de seda que não machucava, eu queria no meu braço e no seu. Mas tinha que ser o mesmo fio. Aceitaria que fosse longo. Tão longo que fosse da minha casa à sua sem quebrar. Da minha casa à cachoeira sem quebrar. E só. Se fosse pro mar, aí... teria que me levar junto. Mas só por capricho meu. Se quisesse, eu ajeitava a linha, esticava, esticava até sangrar meu dedo. Sangrasse o meu, o seu não. Só pra você ir lá e ver o mar, e sentir a brisa salgada, e correr na areia.
Se ainda lembrasse de mim aqui do outro lado, voltava. Se não, cortava com corais enquanto estivesse mergulhando fundo. Eu não ia ficar triste. Eu esperava até ter sua mão perto de novo pra perguntar se você aceita. Se aceita eu colocar seu coração pra descansar no meu lençol.


Mas não tem linha nenhuma. Nem volta.
Por isso minhas coisas vão continuar úmidas e eu, secando por dentro.

domingo, 27 de março de 2011

Como é.

Poderia me levar pra passar o fim de semana. Sem data especial, sem consultar a agenda, sem lembrar do estudo acumulado pra semana que vem.
Apenas vir e levar; como era antes. Como era procurar um lugar pra comer meia noite, algo difícil em uma cidade pouco grande do interior.
Enganar a todos e te manter em casa até o outro dia.
E nem é isso que reclamo.
Sinto a falta do seu braço displicente jogado sobre minha perna enquanto assiste algo no monitor. O estalar de lábios no meu rosto sem pretensão: um jeito de mostrar que gosta que meu rosto esteja ao alcance de um beijo? Falta o recostar de seu tronco cansado no meu colo; oferecendo-me a pele para ser acariciada, eletrizada.
Agora, quando vem, fala de assuntos que não me lembro porque não fala de nós nem de si. Fala pra acelerar o relógio, pra gastar palavras, cansar a língua. Respondo pra fazê-lo rir de um erro desapercebido ou de um detalhe curioso. Nada o faz pousar aqui, no entanto.
Prendo o corpo, os sentidos mas a mente anda solta. Voa como pipa sem dono e sem descanso.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Um saco de pele cheia de ossos e músculos e gordura jogado no sofá.
Ainda faz graça, tira sarro, faz charme.
Por que as palavras são sempre tristes, tão chorosas? O conformismo quase cômico, caricato.
Minha voz parece o grito de uma borboleta (é tão alarmante assim mesmo): frágil e delicada; perdida no seu dia nublado e chuvoso. Quanto mais chove, mais se morre. O riso, o carinho, o grilo (ou seria a esperança?)

terça-feira, 22 de março de 2011

Preciso sair.
Pra parar de pensar no que pode acontecer amanhã, daqui a pouco.
Preciso ficar.
Pra ensaiar no espelho tudo o que direi em minha defesa (ou humilhação, se necessária), pra te ter de volta.
Preciso viver.
Uma vida minha, independente do seu próximo suspiro. Dos seus planos.
Preciso aprender.
A guardar melhor os meus segredos, principalmente os do amor.
Preciso crescer.
De preferência porque você estará em mim.