sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Um lugar chamado tempo

Não estou convencida de que quem cura tudo é o tempo e que isso é um fato. Não é justo atribuir a esse senhor de barbas brancas e compridas a vitória sobre uma dor, uma angústia etc. Há os esforços pessoais sim! O tempo nada mais é que um espaço (ãhn?) onde (e não quando) é possível afastar-se do agente causador do sofrimento mesmo que o método usado seja distrair-se deste, pensar menos... mas, se pensa. Uma sucessão de pequenas feridas quando, por um acaso, o vento traz para aquele lugar em que se buscou refúgio um pedaço da dor: um fio de cabelo da pessoa amada que se foi, o eco de uma palavra dura, o aroma de um quarto. E é com essas pequenas 'pontadas' que vamos nos acostumando e aceitando como parte natural de nossa existência; até um momento que não incomoda mais. Seja porque não se dê mais tanta importância a essas dorzinhas, seja porque elas provocaram o crescimento de uma couraça um pouco mais resistente ao redor de seus alvos; que será cada vez mais grossa a medida que aparecerem novas dores, novas fugas para um lugar chamado tempo, novos pedaços da dor...
Passamos a ser mais confiantes até. Nesse sentido, o tempo é pai porque põe a mão no nosso ombro quando a gente vai contar o que passou durante o tempo; um agasalho aconchegante essa mão; uma roupa nova indicando a ascensão a partir de um ritual sofrido. Parece que o tempo nos dá segurança para deixar escapar um 'já passou, está tudo bem agora' ou um 'já virei essa página'. E quem não ficou lá tempo suficiente, não pode dizer nada disso. Quer dizer, até pode, mas correrá o risco de ver sua dor diminuída aos olhos dos outros que usarão desse argumento cruel para justificar o rápido retorno à normalidade. Ninguém gosta de ver sua dor diminuída, muito menos comparada. Esse medo pode até mesmo levar a uma extensão da dor, além do necessário; atrasos inconscientes.
Seja como for, a terra do tempo pelo menos tem chão. Você pode se sentir perdido no meio de tanto nada e tanto tudo que passa por ali. Mas quando quiser sentir o chão, vai poder pisar. E se sua dor for tão profunda que te induza a um estado quase que inconsciente, se prepare: Os fogos de artifício que marcam o recomeço da contagem do tempo vão te acordar.

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Irreversível

É indizível, tá bem?!
Esse mal estar, essa culpa, esse arrependimento todo. Embora essa seja a situação ideal para traduzir tudo em palavras, eu não consigo. Vim aqui querendo muito.
Posso dizer uma coisa: é como se eu estivesse diante de um jarro caro e exótico, difícil de se achar e, então, por descuido, o quebrasse, provocasse um arranhão, que seja. Não é mais o mesmo jarro; pra qualquer outro que olhe talvez seja; até a própria percepção que o jarro tem de si pode ser a mesma. O fato é que ele está arranhado e eu não tenho meios de consertar. Já consertei outros antes, mas esse era único.
Não posso olhar para aquela pontinha quebrada: eu choro. E não é silencioso; é doído, é incompreensível, afinal, que tenho eu com o pobre jarro?
É que não solto o pedaço que ficou comigo. Mesmo que entre na minha carne, não solto e não entendo.
Só dói. Não há muito que dizer além disso.